sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Equívocos


A VIDA e a actividade de alguns políticos portugueses está recheada de equívocos, e nós, sem darmos por isso, temos andado a viver um autêntico “faz-de-conta”, numa floresta de enganos. Não há documentos nem vestígios que provem que Paulo Portas alguma vez tenha contratado a aquisição de submarinos enquanto ministro da Defesa, ou que se tenha demitido “irrevogávelmente”, que Miguel Relvas tenha frequentado a Universidade Lusófona, que Maria Luís Albuquerque tenha negociado contratos “swaps”, que Rui Machete tenha pisado as instalações do BPN, que Dias Loureiro alguma vez lá tenha passado à porta, a não ser por engano, ou que Cavaco Silva haja adquirido acções daquele banco a preços de amigo, ou que tenha sido sequer Presidente da República, pois nos arquivos nada consta que tivesse recebido vencimentos nessa qualidade.

sábado, 17 de agosto de 2013

Na campanha da CDU
DESVENTURAS DUM COMUNISTA SEM CARTÃO


Em Moscavide um homem idoso, alto, de ar frágil e voz um pouco arrastada aborda a candidata da CDU. Não quer reclamar com a falta de limpeza das ruas, ou dos caixotes do lixo que transbordam para o chão. A questão dele é de outra natureza, quer que a Patrícia lhe arranje o cartão do Partido.

Sempre foi comunista e agora os camaradas do Centro de Trabalho não lhe querem dar o cartão. Outro camarada, que o conhece e ao problema do cartão aproxima-se e lembra-lhe aquilo que ele sabe mas que na sua apreciação dos factos lhe parece pouco relevante, que na renovação dos cartões o dele não foi emitido porque tinha muitas quotas em atraso, e que é preciso agora ele começar a pagar quotas de novo (provavelmente dum valor pouco mais que simbólico).

As explicações do camarada não o convencem, desiste da conversa e volta-se para mim, testemunha ocasional da alegada injustiça, e diz que tem 80 anos (parece ter mais) e que é comunista desde moço novo lá no Couço, que fique eu sabendo é a única terra do País em que o único partido que tem uma Sede é o Partido (mesmo a falar percebe-se a maiúscula).

Não é que ele precise do cartão para ser comunista, explica-me, mas aquele pedacito de plástico, ali no bolso ao pé do coração, é um daqueles prazeres a que se acha com pleno direito. Pelo que entendo uma forma de reconhecimento público que, nesta fase já adiantada da sua vida, seria um testemunho palpável a ligá-lo ao seu passado militante.

Para o tirar daquela fixação no cartão falo-lhe de dois amigos do Couço, se ele conhece, atão não havia de conhecer, os olhos alumiam-se, a rua de Moscavide evapora-se, e ele está no Couço com os camaradas, as lutas nos campos, as reuniões num celeiro que a Pide não conseguia localizar, a campanha de Humberto Delgado, as greves, o cerco à aldeia, as centenas de prisões, o posto da GNR, Caxias, as visitas da mulher com o filho ao colo que ele não podia sequer tocar por causa daquele vidro grosso que os separava e um pide ao lado a intimidar.

Tempos em quem não havia cartão, digo-lhe eu, e então ele volta à terra, encara-me, é verdade, nesse tempo não havia cartões, éramos comunistas mesmo sem cartão, e de forma meio envergonhada como que pedindo desculpa da sua birra em estar para ali a exigir um cartão à camarada que precisa é que a gente todos a ajude e vote na CDU para ela ser a Presidente de Moscavide, dá um abraço à Patrícia e em jeito de despedida: não interessa, com cartão ou sem cartão, hei-se ser sempre comunista toda a vida.

"Rentrée" do PSD



ERA PARA SER cabidela de coelho, mas por causa das dúvidas, das más-línguas e não fosse o diabo tecê-las, acabaram por optar pelo arroz de pato, para os dois mil convivas da tradicional Festa do Pontal do PSD.

terça-feira, 13 de agosto de 2013

UM AMOR ÍMPAR
(Em jeito de homenagem a Lydia Davies, mestre do conto curto).


A Joana e o João foram feitos um para o outro, casaram-se, tiveram duas criancinhas e viveram muito felizes até chegar o tempo de serem mais infelizes do que felizes, infelicidade que para o João acabou quando foi viver com a Paula, e a Joana passou a ser, não a actual, mas a ex ou a 1ª esposa do João.

A Paula e o João, não tiveram filhos, não foram tão felizes como a Paula e o João esperavam ser, até ao dia em que a Paula resolveu ir ser mais feliz para outro lado, deixando o João de rastos por a Paula lhe fazer a ele o que ele tinha feito à Joana.

Depois, nem ela sabe explicar bem porquê, os filhos e tal, a Joana aceitou o João de volta, o que fez da Joana não só a 1ª como também a 3ª mulher do João, embora menos tempo do que tinha sido a 1ª porque entretanto, desta vez em conjunto, sem disputas nem guerras, o João e a Joana decidiram separar os trapinhos.

Acontece que então foi o João a ficar infeliz para caraças, mas para dizer a verdade não por muito tempo, há sempre uma Maria disposta a preencher estes vazios de solidão masculina e, enquanto durou, lá foram os dois, a Maria e o João, felizes, ou infelizes, nem eles próprios sabem dizer bem o quê.

Agora o João ficou outra vez sozinho e a Joana, mesmo sem a desculpa dos filhos, que entretanto cresceram e já saíram de casa, está seriamente a considerar dar uma nova oportunidade ao João, o que, a concretizar-se, fará da Joana a 1ª, 3ª e 5ª mulher da vida do João: um amor verdadeiramente ímpar.