terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Sobre as Presidenciais

HABITUALMENTE não reflicto muito na véspera de eleições. Basta-me observar o dia-a-dia, ter as minhas convicções e andar razoavelmente informado para formar a minha opinião. No entanto, não abdico de reflectir sobre os resultados eleitorais, porque normalmente vão condicionar o meu-nosso futuro, logo, costumo investir algum tempo a digeri-los, e naturalmente, a articular conclusões.
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COMO já referi no meu blog O ESCREVINHADOR, neste acto eleitoral, a abstenção, se tivesse nome de gente, teria ganho as eleições e dado ordem de despejo a Cavaco Silva, do Palácio de Belém. E isso tem um significado: seja pelo variado elenco de candidatos, ou pela vulgaridade dos seus objectivos, os políticos à esquerda de Cavaco Silva falharam redondamente. Não souberam interpretar as inquietações do eleitorado, que subjaz ao descontentamento que se vive, e não souberam (ou não quiseram) almejar entendimento, concentrando-se numa candidatura consensual, que pudesse enfrentar, de igual para igual, o candidato da direita. Resultado: o eleitorado, descontente com a pulverização à esquerda, acabou dar o seu voto aos candidatos “freelancer” (Fernando Nobre e Manuel Coelho), ou então renunciaram a votar. E as conclusões estão à vista: há 5 anos, Manuel Alegre com uma candidatura autónoma anti-PS facturou mais de um milhão de votos. Agora, apoiado por esse mesmo PS e pelo BE perdeu 300.000 votos. Francisco Lopes averbou menos votos que Jerónimo de Sousa nas eleições transactas, e Fernando Nobre que fez questão de se apresentar sem apoios partidários, averbou 600.000 votos. O ex-comunista e actual PND José Manuel Coelho, voluntarioso e a remexer nas feridas abertas, chegou quase aos 190.000 votos.
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POR ISSO, no fundamental concordo com o Brissos, naquele post que ele assinou no blog ESSÊNCIA DA PÓLVORA. E insisto nesta ideia: o PCP, e também o BE, têm especiais responsabilidades em não conseguir encontrar um "challenger". Francisco Lopes passou a mensagem do PCP de forma rigorosa, foi oportuno e pedagógico, porém o PCP continua a perder moderadamente votos, mas é preciso muito mais do que isso. Para as próximas eleições presidenciais (e não só nessas), o PCP precisa de encontrar, ou colaborar empenhadamente na busca de uma figura de consenso, sobretudo independente, mas que se identifique com políticas e causas de esquerda, que seja capaz de reconquistar o eleitorado do PCP, que aglutine o descontentamento que grassa numa significativa franja do PS e estimule o eleitorado do Bloco de Esquerda, que desta vez, tão prematuramente se colou à apressada e apatetada candidatura de Manuel Alegre, uma iniciativa fabulosa e tresloucada, empenhada em tentar reeditar e multiplicar a votação de há cinco anos atrás, quando as condições, eram bem diferentes das actuais. De facto, os tempos são outros, e já era altura de o PCP abandonar aquele princípio (e pelo caminho alguns outros) de que só apoia aquilo que pode controlar a 100%. Talvez por isso, para mim, as eleições presidenciais não tenham passado de um acontecimento menor, em comparação com o que vamos ter que enfrentar no futuro, agora que Sócrates viu renovada a cumplicidade e a protecção institucional da Presidência da República.
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NÃO QUERO falar de números nem de efabulações aritméticas; quero apenas lembrar que quem tem intenções de votar à esquerda, perdeu o pé, e os partidos que têm responsabilidades nisso, e cuja implantação não é negligenciável, pouco ou nada fazem para que a democracia mude de rumo. Por isso, e não só, é forçoso que haja alguém que convença o PCP, de que ele não é apenas um partido contestatário e vigilante da consciência e moral socialista, mas também um partido de poder, não hegemónico, é certo, mas detentor de ideias justas e de quadros altamente competentes e dinâmicos, com grandes probabilidades de participarem na inversão deste declínio, para que a sociedade portuguesa está a ser arrastada. Se o PCP chegou até aos dias de hoje, com as correspondentes despesas que os abanões da história sempre cobram, à mistura com algumas clamorosas e dispensáveis purgas, penso que é chegada a altura de enfrentar a realidade, mandar render a guarda e enfrentar os combates que se adivinham, abrindo novos caminhos e sugerindo outros destinos. Em democracia, os partidos políticos têm, e sempre terão, grandes responsabilidades, porque são a súmula de uma colectividade de convicções, e a História, ao analisar os grandes momentos, não os isenta de responsabilidades, antes pelo contrário.
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FALTA acrescentar um último ponto a este meu devaneio. Embora haja que respeitar a democracia e os resultados eleitorais, não há que ter medo de sermos críticos das escolhas que o povo português fez, e verbalizar porque discordamos dessas escolhas. As decisões da maioria (tanto as boas como as más, segundo o entendimento de cada um) não podem transformar-se numa espécie de ditadura dissimulada da maioria. Cavaco Silva é o Presidente da República Portuguesa, mas não é o “meu” Presidente, e por uma razão simples: Cavaco Silva já deu provas de não ser presidente de todos os portugueses, seja por preconceito, por atitudes, ou por outras razões não negligenciáveis. Se for necessário dizer que o povo escolheu mal, direi que o povo escolheu mal, e até direi porquê. Nem sempre as maiorias, lá porque são maiorias, têm razão, ou sejamos obrigados a dar-lhe razão. Do que não se pode duvidar, é que mesmo podendo estar erradas, essas escolhas são legítimas, logo temos que conviver com elas, e está aí o cerne da democracia. O grande desafio está em encontrar o caminho para o mudar o estado de coisas, e se ele não existir, abri-lo à força de ideias, com arrojo e determinação.

4 comentários:

  1. Fernando,

    Tal como fazes neste post, também argumentei aqui na Essência que a multiplicação de candidatos à esquerda não ia dar bom resultado.

    Contudo não me parece que nisso o PCP tenha particulares responsabilidades. A escolha foi do BE e de Alegre, que confiantes numa votação do povo mais à esquerda numa 2ª volta, embarcaram na quadratura do circulo de apresentar ao eleitorado um candidato da esquerda com o apoio do chefe DESTE Governo. O resultado era previsível, como por aqui na Essência o Dédé não se cansou de chamar a atenção.

    Na actual conjuntura uma candidatura de esquerda com o PS seria sempre (foi) uma contradição de termos, uma piada de mau gosto.

    Perante o facto consumado da candidatura de Alegre fui no entanto dos que defenderam, ANTES da apresentação de Francisco Lopes, a importância duma campanha eleitoral que, entre outros, tivesse como objectivos reforçar a voz dos trabalhadores em luta e alargar a expressão do descontentamento a outros sectores dos que estão a pagar a crise.

    O que implicava um outro candidato com um apelo mais abrangente(que poderia muito bem ser um militante ou dirigente do partido) e outra campanha.

    Na minha opinião a direcção do PCP preferiu "jogar pelo seguro" e, se foi esse o caso, não estaria à espera de nada substancialmente diferente do que aconteceu. Aliás do que ouvimos até agora aos responsáveis parece que foi esse o caso.

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  2. Eureka, este sr.Fernando sabe disto! Este sr. não se poupou a esforços, este sr. concluiu depois aquilo que tinha como tese antes, este sr. viu na candidatura do PCP o passaporete à mais que provável eleição de cavaco Silva à primeira volta. Este sr. vê no PCP o principal obstáculo à unidade daquilo que ele entende de classificar como esquerda. Manuel Alegre e seu muchachos, incluindo Sócrates para ele também são de esquerda. Já não são eles e o actual presidente da república os pricipais responsáveis por todas as politicas de direita que tão nefastas são para os trabalhadores e para o nosso País. Este sr. tirou da cartola uma unidade de uma esquerda que só existe nos seus canhanhos. Ora sr. Fernando, para tanto anticomunismo não precisava de ter feito tanto esforço, tantos rodeios para quê? Porque não foi directo ao assunto?
    Não comento as falsidades que o sr. põe no texto porque são vulgares, muito batidas, só que postas de uma forma diferente.
    E tome nota, os comunistas não precisam de ensinamentos vindos "daí".
    Os comunistas são comunistas, mas burros não!

    Evaristo Fonseca.

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  3. O Brissos tem razão quando diz que a candidatura do Alegre veio desmantelar 90% das hipóteses à esquerda, e que a candidatura do PCP foi um recurso. Porém, o que disse, digo e continuo a dizer é que o PCP "devia", face aos sinais que o poeta já vinha anunciando, ter elaborado uma estratégia para lhe cortar as voltas, e intentar pôr em Belém, uma figura de esquerda, que fosse a equação geométrica capaz de sobrevoar os socialistas, os comunistas, os que se julgam ou fazem passar por comunistas, e também os burros. De qualquer modo, para mim, e o no actual contexto, o problema central do regime (que está bem e recomenda-se) é o governo.

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  4. Triste. Como a falta de argumentos nos leva à provocação.
    Democrático...

    Evaristo Fonseca.

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