A ÚLTIMA edição da revista ÚNICA do semanário EXPRESSO (7-JAN-2011), girou toda ela à volta do número onze (11), celebrando assim, com curiosa originalidade, a entrada no décimo primeiro ano do século XXI ou III Milénio, como quiserem. Vai daí, achei uma boa ideia, e resolvi apropriar-me do tema, embora com uma finalidade diferente. Comecei a vasculhar entre a tralha socratina e, sem grande esforço, consegui desencantar um abundante número de razões (e não apenas onze), para provar que Portugal anda a viver, nestes últimos seis anos (pelo menos), num permanente Estado de Excepção. Passemos aos factos.
1 - Muito embora o ministro Teixeira dos Santos diga que a coisa é definitiva, os cortes nos salários e nas pensões foram consideradas por José Sócrates, medidas temporárias e excepcionais.
2 - As novas regras e o aumento das taxas moderadoras dos serviços de saúde também se enquadram no âmbito de medidas excepcionais.
3 - São excepcionais as injecções de capital no Banco Português de Negócios (BPN), sendo também excepcionais as traficâncias de acções entre a SLN (Galilei) e o dito BPN, já depois do banco ter sido nacionalizado.
4 - O pagamento em 2010, de dividendos aos accionistas de algumas empresas, ainda antes de se conhecerem os resultados das contas desse ano, coisa que só se apura em 2011, é uma medida de excepção, atendendo à crise e ao estado de grande necessidade de muitos dos senhores accionistas.
5 – O Presidente, e também candidato à Presidência da República, Aníbal Cavaco Silva, numa sessão de campanha de eleitoral, ao ser questionado por uma mulher que se queixou não ter dinheiro para alimentar o filho, aconselhou-a a procurar a ajuda de uma instituição de solidariedade que não fosse do Estado, pois são essas entidades que estão, na actual situação de excepção, a substituírem-se ao Estado.
6 - A nomeação do vice-presidente da bancada do PS, Ricardo Rodrigues, homem detentor de grandes competências e especialista em acções directas, nomeadamente na apropriação de gravadores a jornalistas, como presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito ao Caso Camarate, foi uma escolha de carácter excepcional.
7 - A personalidade que vai liderar o grupo de trabalho cuja missão é criar a comissão que vai controlar - notem bem - a despesa pública, é, nem mais, nem menos, que António Pinto Barbosa, que durante 10 anos, e até ao fecho do último relatório e contas do falido Banco Privado Português, não detectou quaisquer irregularidades na actividade da instituição. Como é óbvio, tal escolha apenas pode revestir-se de natureza excepcional.
8 - A taxa extraordinária sobre o sector bancário, que deveria ser o contributo da banca para o programa de austeridade, ainda não foi regulamentada, ao contrário dos cortes salariais, e arrisca-se a ser declarada inconstitucional, porque a sua fixação é reserva legal do Parlamento e não do governo, como este excepcionalmente pretende.
9 - Segundo apurou um estudo elaborado pelo jornal DIÁRIO DE NOTÍCIAS, o Estado tem 13.740 organismos públicos, destes apenas 1.724 apresentam contas, sendo que daqueles só 418 são excepcionalmente fiscalizados.
10 - O ministro Rui Pereira já tratou de todos os pormenores relacionados com a cedência aos E.U.A., das bases de dados com a identificação e dados biométricos dos cidadãos portugueses, como contributo excepcional do governo português, para o combate ao terrorismo.
11 - Está provado que o primeiro-ministro José Sócrates tem sido apanhado a mentir vezes sem conta, porém, são infundadas as acusações de que será um mentiroso compulsivo. Na verdade, diz-se para aí, que tem tudo a ver com situações de excepção, em que é necessário salvaguardar os mais variados interesses nacionais.
Concluindo: Não foi difícil encontrar onze casos, entre muitos outros que gostava de ter citado. Por exemplo, não abordei o caso do excepcional aumento do custo dos transportes, que talvez por hábito, se repete quase todos os anos, mesmo quando não há renovação da frota, os ordenados estão congelados e o preço dos combustíveis desce, nem o facto excepcional do senhor António Saraiva, presidente da Confederação da Indústria Portuguesa, passar a ser o porta-voz do governo, no fim das reuniões do Conselho de Concertação Social, ou a sistemática colocação de afilhados em lugares excepcionais, tanto da administração como da galáxia do sector empresarial do estado, sendo também excepcional a frequência com que o ministro das finanças troca ideias e se aconselha com o quinteto de banqueiros da nossa praça, etc., etc., etc. A verdade é que a lista tinha tendência a tornar-se infindável, e era preciso fazer uma selecção. Mas com estas que compilei, penso ficar demonstrado que em Portugal existe um permanente e excepcional Estado de Excepção, que poucos estão interessados em controlar e contrariar. E os resultados estão à vista: espartilham-se os fracos e deixam-se os fortes com os movimentos livres, a bem da Nação.
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