Capítulo 8 – A Fumaça
e a Vida
Estes ministros que nos
(des-)governam ainda pertencem ao hoje,
mas já lhes vamos esquecendo ou trocando os nomes porque, de facto, pertencem
ao ontem, mesmo ao transantontem. Daqui a poucos anos ninguém os recordará,
apenas restará, como escória a varrer para o vazadouro da História, a
desastrosa política que ajudaram a implementar.
Por outro lado, eles próprios
ajudam ao seu esquecimento ou confusão, pois são uma espécie de pirilâmpos da
política: luzem subita e intermitentemente, surdidos da escuridão, para logo se
apagarem, tragados pela mesma (neste caso, justiceira) escuridão. Tipificam
modelarmente os fogos fátuos da política rasteira e de rastos. Eles foram as
mariasdelurdesrodrigues, as isabeisalçadas, os correiasdecampos, os
teixeirasdosantos, os joséspinhos, os vieirasdecarvalhos. Hoje são os
nunoscratos, os josésviegas, os santospereiras, os vitoresgaspares.
O pirilâmpo da política mais
luzente nos últimos dias tem sido o Miguel Relvas. Ele é a voz do Governo (isto
é, das Tróikas, externa e interna) na Assembleia da República, à cachaporrada
aos protestos da Oposição, ele desdobra-se em entrevistas (na verdade, sempre a
mesma lenga-lenga insípida, inodora e insalubre) na rádio, nos canais
televisos, na imprensa escrita. Goza da fama de ser um durão, sem cedências,
sem recuos. Em suma, um valentaço contra a população de fracos ou médios
recursos, um boquinhas de mel para os “cartolas”.
Tudo isto servido por uma cara
inexpressiva, uma daquelas insonsas fachas onde não estremece uma prega quer
lhe digam que a mãe está a morrer ou a casa a arder ou a mulher a traí-lo
(enfim, a divertir-se!) com o melhor amigo (só um amigão com o sentido do dever
elevado pode trair um tal tipo).
Tudo indiciava no currículo da
criatura as aptidões para o cargo. Obras realizadas?... Experiências levadas a
bom termo?... Estudos particulares?... Não senhora. Um mero curso de Gestão,
obtido sem relevo especial, numa escola entre tantas do Brasil. Ou seja, um
Zero Irrelevante. São justamente estes zeros irrelevantes as criaturas
ajustadas para tais cargos (os de
paquetes das tróikas) : nunca qualquer dúvida de reflexão lhes atravessa o écran
vazio do espírito, nunca qualquer prega da consciência que não possuem os faz
vacilar.
Que defende a ministerial
vacuidade? Que a dívida soberana está a ser exemplarmente
cumprida, que ele já despontam pequenos progressos económicos no livre e
imaginativo empreendedorismo, que ele não se fazem omoletes sem partir ovos e,
aí, no campo do desemprego, é que as coisas claudicam um poucochito, mas que
existe sempre à mão, ou ao pé, de semear, o recurso à emigração, na qual os
portugueses, e agora os jovens portugueses qualificados, dão exemplos ao mundo
(não estou seguro se o dito Relvas emprega este tipo de referências camonianas,
e elas não são já alucinações minhas, mas, francamente, é difícil aturar a estepe do seu discurso sem uns
“shots” gelados de vodka).
A ministerial vacuidade veio
igualmente assegurar a bondade daquela adendazita ao Tratado Europeu: incluir
nas Constituições Nacionais o serviço e o plafonamento da dívida soberana.
Que não senhora, não é preciso nenhum referendo nacional sobre a coisa,
que, praticamente, a adendazita já estava implícita no espírito da União
Europeia prá’í desde o século XIV (mil
trezentos e troca o passo), desde o império marítimo e mercantil da cidade de
Veneza. Que a adendazita não é nenhum golpe anticonstitucioal e uma estocada
letal na soberania, na economia e na democracia nacionais. Ele é lá agora!!...
Olhem, se quisermos procurar no reino dos oceanos uma espécie piscícola
que melhor figure a criatura ministerial, talvez a pescada. Não uma daquelas
pescadas grandes, de alto mar, com carne para alimentar uma família e ainda
convidar amigos, mas talvez uma pescadinha para fritar, de rabo na boca. De
facto, e à falta de melhor opinião que a minha, a pescada não tem um sabor
particular, adopta o sabor do azeite, das ervas, dos molhos, dos eventuais
mariscos que se lhe acrescentar; é uma plataforma alimentar a que se podem
acrescentar sabores para diferentes bocas e diferentes patamares de bolsas.
Senhor Relvas, sem querer parecer paternalista, aconselhava-o a cambiar
de visual. O que usa associa-o inapelavelmente a um retrato-robot composto por
um desenhador das polícias! Olhe, por que não pintar umas mechas verdes nos
seus cabelos?!... Acrescentar-lhes mesmo umas melenas mais compridas, (verdes
também, é claro), descaídas sobre um dos olhos (o esquerdo ou o direito, à sua
escolha).
Assim, “actualizado”, digamos, aproximará referências a uma antiga
cantante nacional, “tiffosi” de um dos grandes clubes nacionais, para o dito
grande clube e todos os admiradores desse clube. Além de que é perfeitamente
justificável, dada a associação óbvia entre a verde relva dos campos de
futebol, das “maisons” e o seu apelido de baptismo. Passará a ser uma variedade
de mariajosévalérioverde masculina... É original... Não lhe cobro nada pela
sugestão, mas não caía mal um abatimentozito no IRS.
Ainda do lado da “fumaça”, é
impossível deixar de assinalar a lamentável posição assumida pela Associação 25
de Abril, a que deu cara o coronel Vasco Lourenço. Associaram-se de imediato
o poeta Alegre e o doutor Mário Soares, isto é, os “faz-tudo” do costume. Que
fique igualmente claro que o senhor coronel Vasco Lourenço é de há muito um
aliado (mal-) encapotado do Partido Socialista.
O 25 de Abril, os valores da Liberdade, da Democracia (nas suas
vertentes económicas, laborais, sociais, de saúde pública, educativas,
culturais, desportivas, científicas, artísticas) defendem-se, também, dando-lhe
visibilidade, recontando e reflectindo sobre a sua história. Não é recuando
e cedendo aos valores do passado, que gostariam de reduzi-lo a uma saudação
protocolar, envergonhada, de cinco personalidades, defronte da estátua do Cutileiro,
no cimo do parque Eduardo VII. Nem, muito menos, uma data subordinada aos amuos
e aos desígnios de uma mãocheínha de Castafiores indígenas.
Mas do lado da vida real, concreta e com futuro, estão, como sempre têm
estado, o PCP, a CDU, Os Verdes, a CGTP, alguns Sindicatos que das garras da
UGT se vão libertando, e milhares e milhares de cidadãos descontentes com a
política das tróikas, que no 25 de Abril, no 1º de Maio, e em todas as lutas
subsequentes, irão exigindo um futuro digno, soberano e democrático para si e
para os seus filhos.
Do lado da vida concreta sabe bem igualmente assinalar a transcrição de
um artigo de Thierry Mayssan (“Avante!” de 19-4-2012, pp. 26 e 27) que esclarece o fracasso da guerra de “baixa
intensidade” conduzida pela NATO e pelo Conselho de Cooperação do Golfo contra
a Síria e o Povo Sírio.
Desse artigo, que nada substitui a
leitura integral, destacamos 3 pontos que confrontam a caterva de mentiras que
têm sido despejadas, de há anos para cá,
sobre o país e a região: o presidente sírio Bachar el-Assad continua
a ser o chefe de Estado mais popular do mundo árabe; os auto-intitulados
“Amigos da Síria”reconheceram o fracasso da “guerra de baixa intensidade” que
tinham promovido e mudaram de estratégia, concentrando agora a sua acção em
campanhas mediáticas contra o seu país (o controle destas campanhas é feito a
partir da Casa Branca); o objectivo destas campanhas é desenhar a China e a
Rússia como ditaduras solidárias com outras ditaduras; Washington encontra os
seus aliados nos Emiratos, na Alemanha, na França, na Liga Árabe, na ONU, em Kofi Annan, na
Amnistia Internacional, na Human Rights Watch, na Federação Internacional dos
Direitos do Homem.
E entre a “fumaça” virtual e a Vida me despeço, confiantemente direito,
e directo, a mais duas jornadas de luta: o 25 de Abril e o 1º de Maio de 2012!
Eduá Heteronimus
24 de Abril de 2012
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